sábado, 24 de janeiro de 2009

segredo de estado
segredo de-testado

Mesmo como excepção

mesmo como excepção
guantanamo
não era lá muito apresentável

domingo, 18 de janeiro de 2009

Como os bichos

Às vezes, vinha alguém bater à porta. Como a rádio deixara de emitir, só podia confiar no que diziam esses viandantes, à deriva, caminhando não sei para onde. Pouco a pouco, foram rareando essas visitas. Calara-se toda e qualquer voz, todo e qualquer vestígio humano. Só o miar paradoxalmente cioso dos gatos, me dava a certeza de que continuava a haver mais vida animal. Um dia, arrisquei sair, e tive a confirmação de que desenvolvera essa rara doença, que me fez resistir à catástrofe, como os bichos

Dia após dia

Às vezes, vinha alguém abrir a porta. Com o passar do tempo deixou de aparecer
aquela senhora gentil, que nos mandava entrar e pormo-nos à vontade, como em «nossa casa» (confirmaram-nos, depois, a suposição de que tinha morrido). Dia após dia, a porta continuava fechada, as paredes deixando cair o salitre. Cada vez mais, temíamos o que pudesse ter acontecido. A inspecção sanitária levara os últimos despojos, as últimas résteas dessa memória da casa. Francamente, nunca soubemos porque é mais ninguém ligou nenhuma à situação.

sábado, 17 de janeiro de 2009

Hai ku

Ode
Louca

Ode louca
Odelouca

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Concerti Grossi

Ouvir, por exemplo,
os Concerti Grossi, de Haendel
na época da sua estreia
e calcorrear as ruas escalavradas
do século XVIII
a lama das ruas do século XVIII
a neve nas ruas do século XVIII
os pregões, as conversas das ruas do século XVIII
e os trilhos das carroças do século XVIII

e a lembrança de uma música redentora
dentro de nós
intemporal
soberna
glorificando Deus
acima dos homens
irmanados
e desprevenidos

domingo, 4 de janeiro de 2009

Diálogo

«Ele foi julgado por homicídio».

«Mas foi absolvido».

«E isso é suposto ser um consolo?».

sábado, 3 de janeiro de 2009

Ilha de Mocambique 2003 (02 de 02)

Ilha de Mocambique 2003 (01 de 02)

Da fragilidade e da morte

Esta trágica condição
de ser humano
tomada a consciência
da fragilidade e da morte
com o acto de nascer
e a experiência de viver

porque se o divino
domina o Tempo
o Tempo é, afinal, Deus,

mostrando-nos a contingência
e o ritmo das gerações
que se sucedem,
como as folhas das árvores

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Travessia do deserto

Atravessar o deserto
e nunca acabar

Nunca terminar
essa travessia

O longe é o refúgio
para não aparecer

A demora é a desculpa
para ficar sempre além

Não voltar à ribalta
e poder, somente,
percorrer o caminho
para me encontrar

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Hai ku

Na bruma
brama
o brâmane.